Segundo Emilio Zamboni Mendonça, da Universidade Metodista, “o rádio foi
o principal ponto de apoio do crescimento da Igreja Pentecostal Deus é
Amor.” Há, segundo Freston (1995, p.128), pelo menos cinquenta placas
acima do púlpito do Templo da Glória de Deus, na Baixada do Glicério,
com indicações das rádios que veiculam os programas da IPDA. Transmitido
a partir da sede mundial, o programa “A Voz da Libertação” chega aos
lares de milhares de brasileiros e é retransmitido para mais de 17
países via uma rede de mais de quarenta rádios pertencentes à Igreja
Deus é Amor.
Particularidades
Diferente da Igreja Universal do Reino de Deus, a IPDA tem como base de
atuação os menos favorecidos da sociedade. “Os muito pobres são mais
facilmente atingidos pela pregação dos milagres e dos prodígios”,
explica Leonildo Silveira Campos (Lusotopie, 1999, pp. 355 – 367). Dada
à ênfase em milagres e cura divina – característica comum à segunda
onda pentecostal brasileira -, a IPDA tem alcançado centenas de pessoas
ao redor do mundo. “É uma agência de cura divina”, classificam os
pesquisadores Mendonça e Velasques (Chestnut, 1997, p. 38). Cura divina,
exorcismo, combate às religiões afro-brasileiras e ao catolicismo
popular são algumas de suas características, seguidas e adaptas pelo
Neopentecostalismo. Freston (1995, p. 128), associa a presença de
obreiros uniformizados (na IURD) e o uso de técnicas de exorcismo (no
palco e com direito a entrevista com demônios), como elementos oriundos
da Igreja Pentecostal Deus é Amor. O uso da radiodifusão também seria um
elemento seguido pela IURD e seus clones.
Nos programas radiofônicos e nas mais de 11 mil congregações da IPDA,
David Miranda exerce controle absoluto sobre os membros. O regulamento
interno, aprovado em 1986 e adaptado nove anos depois, estabelece uma
série de normas às quais os membros são convidados a seguir: aos homens,
é proibido o uso de bigode, costeletas, bermudas e camisetas sem
mangas; às mulheres, corte dos cabelos, calça cumprida, maquiagem e
adornos. Há outras restrições – impostas a membros de ambos os sexos -,
como não participação em festas, locais de entretenimento, porte de
armas de fogo, modalidades esportivas e aquisição de aparelhos de
televisão.
Embora considere natural que uma igreja desenvolva sua identidade com
base em usos e costumes, o teólogo Alex Belmonte chama a atenção para a
base teológica. Segundo ele, uma das causas da fragilidade doutrinária
da IPDA deve-se a ausência de uma base teológica sustentável. Opinião
compartilhada por Sidnei Moura que, por 15 anos, congregou na IPDA. “A
Igreja acabou cedendo, por longos anos, a uma série de novos modismos
que, aliados a falta de conhecimento bíblico e a centralização radical
da pregação em temas subalternos e ênfase demasiada em milagres e
experiências pessoais, encontrou em seu seio um campo fértil para seu
desenvolvimento”, avalia Moura. Ele cita ainda a exposição ao medo como
uma forma de coerção. “Os fieis acabam seguindo as imposições da igreja
principalmente por coerção, que é aplicada através da exposição ao medo:
constantemente são bombardeados pelos sermões recheados de discursos de
medo da condenação eternar e exposição aos demônios”.
Polêmicas
A Igreja Deus é Amor vem enfrentando uma série de problemas desde pelo
menos 1976, quando 26 pessoas morreram vítimas de uma queda de uma laje,
ao participarem da inauguração de uma filial da IPDA no Rio de Janeiro.
Processado, David Miranda foi absolvido. Nove anos depois, Miranda, sua
mulher e filha são denunciados à justiça de Porto Alegre por supostos
“crimes” de curandeirismo e estelionato, mas acabaram livres das
acusações. No começo de 2000, nova bomba: um ex-tesoureiro da IPDA (que
teria trabalhado para a Igreja por 18 anos) procura a TV Bandeirantes
para fazer uma série de denúncias contra a Igreja, que envolviam
remessas ilegais de dólares para o exterior e associação com o
narcotráfico. De acordo com o advogado Ruben Cavalheiro, representante
da IPDA à época, o ex-tesoureiro vinha tentando “extorquir” a Igreja em
R$ 1,5 milhão e ameaçado de tornar públicos alguns documentos oficiais.
Apesar de declarações do advogado da IPDA – de que o ex-contador teria
tentado extorquir a igreja – e de que nenhuma condenação teria sido
imposta à cúpula, o testemunho de Guilherme Filho Prado serviu de base
para uma operação de busca e apreensão na casa de David Miranda, em
setembro de 2000, e outras investigações promovidas pela PF de Foz do
Iguaçu, São Paulo e Rio de Janeiro, além de CPIs do Narcotráfico de São
Paulo e Brasília. A suspeita é de que a Andy Viagens e Turismo, com
escritório na Vila Mariana (SP) e de propriedade da
Igreja Deus é Amor,
serviria de base para operações de lavagem de dinheiro. De acordo com
investigações realizadas pela Polícia Federal, somente entre 1992 e 1996
– portanto, anterior às denúncias de Prado – cerca de 37 bilhões de
reais teriam deixado o Brasil através de Foz do Iguaçu e tinham como
destino contas do fundador da Igreja Deus é Amor. Indiciado por evasão
de divisas e lavagem de dinheiro, David Miranda compareceu a
Superintendência da Polícia Federal de São Paulo na tarde de 16 de maio
de 2000 para prestar esclarecimentos sobre o envio de remessas de
dólares para contas associadas à CC-5.
Dúvidas
Até que ponto o relato de Guilherme Filho Prado pode ser considerado
confiável? Sidnei Moura lembra que, por ocasião de uma sabatina na
ALESP, na qual Prado foi convidado como testemunha chave, após entrar em
contradição em diversas declarações que haviam sido dadas a imprensa,
um dos parlamentares o questionou sobre possíveis provas. Em resposta, o
ex-contador afirmou que teve acesso a várias remessas ilegais de
dinheiro, mas que a única coisa que podia afirmar sobre o envolvimento
de traficantes foi ter visto os filhos de David Miranda recebendo tais
traficantes na sede mundial. Na ocasião, a IPDA fez uma gravação de
trechos da sessão onde Guilhermino Filho Prado é confrontado e que
passou a ser transmitida em meios de comunicação ligados a IPDA.
“Lembro-me que era obrigado veicular a gravação mesmo em programas de
horários alugados em rádios, e nesses programas a ordem era rodar de
meia em meia hora, como também nos cultos da igreja sede – houve até
cultos especialmente convocados apenas para se ouvir tal gravação”,
declara Sidnei Moura.
Ainda de acordo com Moura, o que lhe pareceu estranho foi o fato de que,
antes de ir à ALESP, o ex- contador fez um verdadeiro alarde em
diversas emissoras de rádio e televisão, e na última aparição na TV
disse ter provas irrefutáveis da participação da IPDA nesse tipo de
delito, e que apresentaria documentos que comprovariam tal esquema.
“Depois de falar secretamente com membros da comissão foi a público sem
uma única prova concreta sobre a denúncia – de envolvimento da IPDA com o
narcotráfico”, revela Moura. O que ocorreu entre a última declaração de
Prado, na TV, e a sabatina na ALESP? Não se sabe ao certo até que ponto
o ex-contador teria mentido ou ocultado provas, e até onde possuía
informações, mas seus depoimentos na TV Bandeirantes e, principalmente,
na Polícia Federal, foram claros no sentido de que a Igreja Deus é Amor
teria algum tipo de envolvimento com esquemas ligados ao tráfico de
drogas.
A dúvida é de que maneira e por meio de qual elo frágil narcotraficantes
teriam se infiltrado. Sidnei Moura parece nos indicar um caminho. “O
caso Guilhermino não foi o único a levantar dúvidas sobre o tema – os
dois filhos de David Miranda são conhecidos por terem uma relação
instável na igreja, saem e voltam com frequência, e quando saem
envolvem-se com traficantes. Porem, a força do sistema é extremamente
cuidadosa para não expor suas fragilidades – daí a incerteza sobre todas
essas acusações”, conclui Moura. Sobre a maneira como a instituição
lidava com as denúncias, Moura ressalta que o “caso acabou sendo
proibido de ser falado na igreja e membros chegaram a ser disciplinados
por terem acesso a tais reportagens ou por insistirem no assunto.” Em
uma circular despachada recentemente pela sede mundial da Igreja Deus é
Amor, obreiros e demais membros são expressamente proibidos de manterem
qualquer tipo de contato com ex-membros da IPDA.
Outros problemas
Se externamente a IPDA enfrenta acusações de evasão de divisas e lavagem
de dinheiro (ainda não comprovadas), internamente também vem
enfrentando uma série de problemas que atingem diretamente a cúpula. Com
idade avançada (completou 76 anos em julho de 2012), David Miranda
começa a dar sinais de que em breve terá de ser substituído na
presidência. A dúvida permanece: quem deverá substituí-lo? Sérgio Sóra,
ex-braço direito e genro do fundador era, até pelo menos o começo de
2005, a pessoa mais cotada para assumir a presidência mundial da IPDA.
No entanto, desentendimentos e troca de acusações forçou a sua saída e
de sua esposa Léia Miranda (atualmente se encontram separados, tendo
Sérgio Sóra fundado, alguns meses depois, no Rio de Janeiro, a Igreja
Evangélica Vida em Cristo; Léia Miranda congrega em uma igreja batista,
também no Rio de Janeiro). Antes de Sóra, outros dois líderes da IPDA já
haviam deixado a denominação para fundar seus próprios ministérios,
entre 1991 e 1995. O “autoritarismo” de David Miranda, o rígido controle
dos cofres das filiais e mudanças repentinas nas diretrizes da Igreja,
são algumas das queixas e motivos de deserção. Declarações polêmicas do
fundador, como a de que “Deus não opera nas Assembleias de Deus” e de
que as redes sociais Twitter e Facebook (quando pessoas próximas e
demais membros da IPDA possuem perfis) são “ferramentas do Diabo”,
também são alvos de críticas e descontentamento geral.