quarta-feira, 23 de agosto de 2017

Desabafo de um ecólogo cristão


" Vitória, novembro de 2015. 

Ver o cumprimento das profecias assistindo aos sinais dos tempos acontecendo diante dos meus olhos é triste. Mazelas, guerras, refugiados, incêndios, lama, corrupção, a história dando voltas e a humanidade presa em si mesma.

Não há esperança de melhora. A humanidade deveria sofrer impeachment. Mas não há quem vote contra si mesmo em benefício do outro. Não há amor ao próximo. Tudo é vaidade. Tudo é vaidade.

Penso que não há nada a fazer.

Apenas assistir. Desistir de crer que algo melhor virá. Nossa melhor chance é uma pandemia letal. Assim alguns sobrariam pra recomeçar, mas com grandes chances de repetirem a mesma história. A natureza é má. Egoísta. Tudo existe em função de manter um sistema ecológico cruel em que a morte sustenta a vida. Quando foi diferente? No Éden? Tem como voltar ao começo? Não.

A floresta queimou. O rio secou e foi sepultado. O gado morreu de sede. As aves pousaram pra sempre. A harpia morreu de fome. A anta, atropelada. O tubarão morreu mutilado, afogado. A moqueca não se sustenta; vai extinguir o badejo, já acabou com o robalo, vai acabar com o cação, que, sim, é tubarão. A torta rebaixou o palmiteiro a criminoso, exterminador de jussaras. As pessoas estão revoltadas com a corrupção, mas não limpam suas próprias casas. Querem prender, matar, destruir, mas quem vai mudar a situação? Não há quem faça. Todos querem morar de frente pro mar em varandas de vidro com ar-condicionado aprisionando a brisa do lado de fora. Melhor uma tela grande virada para os fundos projetando a projeção mental de vida ideal de cada um. O porto vem. Vai destruir a restinga, aterrar os ninhos. Afinal “é porto, e não creche de tartarugas”.

Assim vamos caminhando para o fim, que será seco. Na maior parte do tempo será seco, ou inundado por breves períodos. O fim será esfumaçado, tóxico, quente, seco. Os iguais morrerão estando ainda vivos porque será melhor estar morto. Os superiores assistirão a tudo lamentando de dentro de seus carros e apartamentos. Pensando como era bom, mas agora os miseráveis estão por toda parte e tudo foi destruído. Não haverá sábado de praia porque a água será suja. Melhor será assistir aos filmes dos anos 90 e sentir saudade de como era. A roça estará seca e sem alimento porque não suportará a falta de água. Debaixo da terra a água destilará décadas de pesticidas e será salgada também. Um veneno. Nas torneiras sairá água na casa dos superiores, mas muito cara para os iguais. Baratas, ratos e urubus restarão alimentando-se de milhões de toneladas de lixo acumulado em locais que um dia foram belos. A realidade chegou. O futuro, não haverá. Sem futuro. Governantes iludidos, brigando por poder de nada. Talvez por água de alguma fonte protegida. Milhares esperando chegar o caminhão pipa para encher suas vasilhas. Vacas secas. Costelas aparentes. Sem leite nem carne. Não haverá esperança. Não há esperança. Vem, Jesus! Volte e nos leve consigo. "

Esse cenário de filme de ficção-tragédia (a carta acima) é o que meu coração sentiu e minhas expectativas humanas conseguiram divisar em um momento de frustração e impotência diante da realidade atual. Mas, pensando bem, isso não combina com a mensagem de esperança que a Palavra traz de uma criação renovada, novos céus e nova terra. Mas minha humanidade esquece isso. Onde buscar força para não perder a esperança?

A esperança vem da fé na regeneração do mundo junto com a glória dos filhos de Deus (Rm 8.20-22). Por pior que a realidade atual pareça, me esforço para compreender que a criação geme com dores de parto. E isso precede o nascimento de uma nova ordem mundial. “O mundo não será destruído, mas sim libertado, transformado e inundado da glória de Deus”.¹ Há esperança! Ela é Cristo!

• Marcelo Renan de D. Santos, médico veterinário e ecólogo, congrega na Igreja Batista da Praia do Canto, em Vitória, ES.

Nota
1. STOTT, John. A mensagem de Romanos. São Paulo, ABU Editora, 2000.

Nenhum comentário:

Postar um comentário